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Uma tarde em Stratford-upon-Avon, a cidade natal de William Shakespeare

20 / abril / 2022

Por Marina Ginefra*

É difícil imaginar que figuras como Shakespeare realmente existiram. E quando eu digo “existiram”, eu realmente quero dizer existiram. Imagine só: ele acordava todos os dias, se alimentava, precisava cortar e pentear os cabelos, brigava com o pai porque não queria ser luveiro, pagava suas contas e, quando acabava a tinta, tinha que comprar mais para continuar trabalhando. Parece esquisito assimilar que a pessoa que escreveu obras tão emblemáticas para a humanidade como Hamlet, Macbeth e Romeu eJulieta se preocupava com atividades tão corriqueiras. Para aceitar tudo isso, eu teria que conhecer o lugar onde ele viveu, dar uma de stalker – por assim dizer –, conferir se a casa onde ele nasceu e morou por boa parte da vida era real. É o que todo mundo faria, certo? Foram esses pensamentos malucos que me levaram a Stratford-upon-Avon, a cidade natal do Bardo.

A oportunidade de conhecer o local surgiu quando minha mãe e eu decidimos nosso destino de férias: Escócia. Foi um trabalho de convencimento até que bem simples da minha parte, porque ela adora uma aventura. Comprei um guia desses bem completos sobre o Reino Unido e fiquei mostrando vários lugares que seriam bacanas de visitar. Na época não existiam voos direto do Brasil para a Escócia, era preciso desembarcar na Inglaterra e ir de lá ir para a ilha. Hum, visitar a Escócia e de quebra a Inglaterra. Nada mau, né? Passamos um tempo juntando a grana, preparamos tudo e compramos um pacote de viagem que ia de Londres até Inverness de ônibus, parando em várias cidades no meio do caminho. Uma delas era Stratford-upon-Avon, e na mesma hora pensei: aí está a minha chance de dar um rolê na casa do Shakespeare! Fizemos nossas malas e partimos, prontas para gastar nosso inglês.

De Londres até Stratford-upon-Avon são mais ou menos duas horas de viagem de ônibus. Dica: se tiver tempo, vale a pena dar uma paradinha em Oxford, que fica bem no meio do caminho e é um ótimo passeio.

Cheguei na cidade onde Shakespeare nasceu mais ou menos na hora do almoço e saltei do ônibus em frente ao Royal Shakespeare Theatre, teatro que fica às margens do rio Avon e que funciona como sede da Royal Shakespeare Company (RSC), uma das principais companhias teatrais da Inglaterra. A situação parecia bem surreal, pois – apesar de ter visto fotos e estudado um pouco sobre a vida do dramaturgo na faculdade de Artes Cênicas –, nunca consegui imaginar de fato como seria estar fisicamente ali. Para todos os lugares que olhava eu me deparava com  detalhes da presença do Bardo e, então, a ficha começou a cair.

Royal Shakespeare Theatre

Quando fiz minha visita, ainda não estávamos passando por uma pandemia e a cidade estava relativamente movimentada, com uma feira acontecendo naquele dia. As ruas ao redor do Royal Shakespeare Theatre estavam cheias de barraquinhas e famílias passeando, o que deixou o clima ainda mais agradável. O sol não era muito forte, mas acredito que, para os ingleses acostumados com dias nublados, aquele era o dia ideal para um passeio.

Minha primeira parada foi o teatro, que passou por uma obra de renovação entre  2007 e 2010. Ele é enorme, feito de tijolos vermelhos e muito imponente. É nesse prédio que a RSC se apresenta, desenvolve e constrói os cenários e figurinos de suas peças, além de oferecer pequenas exposições do seu acervo. Infelizmente, meu tempo de passeio era apertado e não pude ficar para assistir a uma apresentação, mas só estar lá e sentir a energia de uma das companhias de teatro mais famosas do mundo foi incrível.

Pertinho da RSC fica a Henley Street, a rua mais famosa e visitada da cidade. Se você já leu Hamnet, deve conhecer bem o cenário. É nela que podemos encontrar a casa onde William Shakespeare nasceu e morou até seus vinte anos aproximadamente e passear por um calçadão repleto de lojas, restaurantes e construções no estilo Tudor. Como a cidade é bem pequena, fazer o passeio a pé é a melhor opção.

Logo no começo da Henley Street fui recepcionada pela estátua de um bobo da corte, personagem que aparece em várias peças de Shakespeare. A escultura foi um presente de Anthony P. Bird O.B.E. para a cidade. Um pouco mais adiante, quase na altura da metade da rua, fica o Shakespeare’s Birthplace, a atração mais importante de toda a Stratford-upon-Avon e motivo pelo qual eu tanto quis conhecer esse lugar.

Estátua “The Jester”

A casa é bem baixinha para os nossos padrões modernos e parece ter saído direto de um conto de fadas. Conservada, ela tem janelas com padrões de losangos e um charme indescritível – só a visitando para entender. Assim como Maggie O’Farrell narra em Hamnet, a casa é um personagem, parece viva.

A entrada da exposição fica ao lado, no Shakespeare Center. Foi dali que eu e os outros visitantes fomos levados para o jardim e também para a entrada da casa. Lá dentro, é possível fazer um tour com guias que contam tudo sobre a vida de Shakespeare nesse lugar. Os móveis não são mais os originais, mas tudo é mobiliado como na época. Pude ver, inclusive, como era o trabalho dos luveiros no século XVI, profissão exercida pelo pai de Shakespeare e o grande negócio da família, uma das mais ricas da cidade.

Shakespeare’s Birthplace

Para quem quer continuar o passeio, ainda existem mais quatro propriedades da família abertas ao público: Shakespeare’s New Place (lugar no qual o dramaturgo morou no fim da vida e onde hoje em dia existe um lindo jardim), Hall’s Croft, Anne Hathaway’s Cottage e Mary Arden’s Farm. As três primeiras ficam localizadas no centro de Stratford-upon-Avon e podem ser visitadas no mesmo dia, mas as duas últimas ficam fora da cidade.

Encerrei minha visita ali mesmo, pois já estava quase perdendo o ônibus. Hoje, depois de ler Hamnet, me arrependo de não ter tentado ficar mais um pouco para conhecer as outras residências, especialmente o chalé de Agnes, também conhecido como Anne Hathaway. Na hora de ir embora, percebi uma placa que indicava um hotel chamado The Falcon (o falcão). Talvez tenha sido um sinal de Agnes querendo me dizer que uma visita só não bastava e que um dia eu precisaria voltar e conhecer muito mais sobre os moradores e histórias daquele lugar.

*Marina Ginefra é publicitária (IBMEC), figurinista (UFRJ), tem um fraco por qualquer tipo de conteúdo relacionado a Shakespeare e trabalha como assistente de marketing na editora Intrínseca.


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Comentários

Uma resposta para “Uma tarde em Stratford-upon-Avon, a cidade natal de William Shakespeare

  1. Terminei de ler esse livro é já dei de cara com essa publicação. Deve ter sido uma experiência incrível ?

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