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A importância do chá para o povo inglês durante a Segunda Guerra Mundial

4 / março / 2021

Cecil Beaton Photographs, 1944.

Com a ameaça nazista cada vez mais perto durante a Segunda Guerra Mundial, a rotina dos ingleses mudou completamente. A venda de mapas, por exemplo, se tornou limitada, o governo distribuiu máscaras de gás, regras de blecaute escureceram as ruas a ponto de acidentes serem comuns e o racionamento de alimentos passou a ser uma realidade diária. As pessoas, no geral, compreendiam a necessidade dessas medidas, mas existia um item da cesta básica inglesa que, quando afetado, causava descontentamento generalizado: o chá.

No verão de 1940, o Ministério da Alimentação propôs reduzir a cota de chá a meros 56 gramas por semana. Frederick Lindemann, o conselheiro científico pessoal de Winston Churchill, logo percebeu que essa decisão poderia trazer problemas. Afinal, “o único bálsamo universal para o trauma da guerra era o chá”. A preocupação do Professor, apelido de Lindemann, era tamanha que ele decidiu escrever um memorando para o primeiro-ministro britânico se opondo àquela proposta.

De acordo com Lindemann, “grande parte da população, composta de trabalhadoras que fazem também as tarefas da casa e de faxineiras, depende exclusivamente do chá como estimulante. Está longe de exagero chamar o chá de seu principal luxo; na verdade, esse é o único luxo que ela tem”. Limitá-lo, alertava o Professor, poderia ter consequências de longo alcance, pois o chá mantinha o moral da população. “Essa é a classe que mais sofre com a guerra. Enfrenta o impacto direto dos altos preços e da escassez. O blecaute e, em certos casos, as retiradas impõem ainda mais dificuldades. E eles não têm a compensação dos novos interesses e aventuras.”

Uma lojista valida os cupons de uma caderneta de racionamento britânica, 1943.

Lindemann estava certo em sua percepção sobre o papel da bebida para o povo. As pessoas preparavam chá durante ataques aéreos e depois deles também, enquanto descansavam da tarefa de retirar corpos de prédios bombardeados. Todos os mil postos de observação, que vigiavam o céu da Inglaterra em busca de aeronaves alemãs, eram abastecidos com chaleiras. Nas propagandas, preparar uma xícara de chá se tornou uma metáfora visual para seguir em frente. O chá marcava o dia, era conforto e história. Acima de tudo, era inglês. Enquanto houvesse chá, haveria a Inglaterra. Mas a guerra e o racionamento estrito ameaçavam abalar até o mais trivial de seus pilares.

Apesar dos esforços de Lindemann, houve um reajuste no racionamento de chá: 85 gramas por semana. E assim foi até 1952. Enquanto isso, as pessoas secavam as folhas usadas para poder fervê-las novamente. 

Em O esplêndido e o vil, novo livro do jornalista Erik Larson, mergulhamos no ano mais sombrio da Segunda Guerra Mundial para o povo britânico. Com base em diários, documentos originais de arquivos e relatórios de espionagem secretos — alguns deles abertos apenas recentemente —, Larson reconstitui o cotidiano do recém-eleito primeiro-ministro Winston Churchill e seu círculo mais íntimo, mesclando histórias curiosas — como esse episódio do chá — e mostrando em detalhes como a liderança de Churchill foi capaz de unir uma família e um reino. 

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