Alfredo Nugent Setubal

Lacunas para a imaginação: o que você acha de finais abertos?

10 / junho / 2020

Como comentei no texto da semana passada, foi muito divertido acompanhar a reação dos primeiros leitores de O livro de Líbero, enviado pelo intrínsecos em março. Tivemos de tudo: elogios, críticas e perguntas que nunca tinham me passado pela cabeça, mas uma das questões mais recorrentes foi, sem dúvida, sobre os finais “em aberto”.

Não vou entrar em detalhes para não dar spoiler do desfecho do livro, mas acho essa discussão fascinante, tanto como leitor quanto como escritor. É claro que não existe certo ou errado, trata-se de uma questão de gosto, mas acho que obras que terminam sem dar todas as respostas ganham uma força única, justamente porque deixam perguntas que permanecerão rondando em minha cabeça por muitos dias ― ou até anos.

Dom Casmurro, talvez, seja o exemplo mais óbvio na literatura brasileira e não por acaso estamos há mais de um século discutindo se Capitu traiu ou não traiu. A questão, no entanto, vai muito além do universo dos livros e se esparrama para outras áreas como o cinema e, mais recentemente, as séries de TV. Alguns dos meus filmes favoritos têm em comum essas perguntas sem resposta, esses finais que ressignificam o começo: A Origem, Memento, Ilha do Medo, 2001: uma odisseia no espaço são apenas alguns exemplos que me passam pela cabeça.  Sem falar de Lost, Mad Men e Breaking Bad.

Eu sei: obras com finais em aberto são sempre polêmicas, não agradam a todos. Entendo que existam leitores que, de tão apegados à história e seus personagens, gostariam de saber tintim por tintim o destino de todos eles. Alguns leitores, por exemplo, me escreveram perguntando o que aconteceu com o personagem A ou o personagem B após a última página de O livro de Líbero. E, para a surpresa deles, em geral minha resposta é: nem eu sei. Para mim a história acaba ali e os personagens seguem adiante por conta própria, ou melhor, por conta de cada leitor.

Eu, como leitor e espectador, gosto disso em um livro ou filme: ficar com algumas brechas e, assim, ter liberdade de participar da construção da história. Gosto desse espaço em branco que deve ser preenchido pela imaginação do leitor ou espectador. Como escritor, porém, me sinto no dever de balancear essa liberdade, esse espaço para interpretações, com certa generosidade com o leitor, que acompanhou pacientemente aquelas páginas até o fim. Um equilíbrio sutil e difícil de calcular.

Talvez por isso eu tenha recebido relatos de pessoas que acharam o final de O livro de Líbero triste e outras que, pelo contrário, o acharam esperançoso. Qual visão está certa? Nenhuma, ou melhor, as duas. A resposta, no fundo, é individual, misturada com a própria história, trajetória e visão de mundo de cada um. A meu ver, a força e a beleza da obra estão justamente nisto: na pluralidade, nos olhos de quem lê.

 

Comentários

Uma resposta para “Lacunas para a imaginação: o que você acha de finais abertos?

  1. De fato, ainda que eu goste dos arcos fechados, especialmente do protagonista, não entregar todas as respostas torna a experiência da leitura bem mais instigante.

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