Leticia Wierzchowski

Mais um Natal

18 / dezembro / 2015

natal

Ouvi um amigo dizer que não gostava de datas festivas como o Natal porque elas eram iguais a muletas: as pessoas se penduram numa espécie de picadeiro luminoso e esquecem a realidade ao seu redor. Ou então suspendem suas mágoas no prego da fantasia, veem tudo cor-de-rosa e saem distribuindo presentes a torto e a direito para quem lhes cruzar o caminho. Já escrevi várias vezes aqui que gosto imensamente do Natal. Isso foi, mais do que tudo, um gosto que meu pai me passou — talvez no sangue, talvez nas noites da minha infância, que ele sabia povoar de mágica e encantamento. Filosofando sobre o Natal ao pé de um sinal de trânsito fechado numa avenida porto-alegrense, concluí que datas festivas não são bengalas, mas cabides. Roupa em cabide é outra coisa: a lei da gravidade exerce seu talento sobre as fibras e tudo fica mais bonito do que dobrado em quatro partes. Assim é com o Natal: penduramos a vida num cabide e ela fica mais bonita, perde as rugas e revela segredos que o fundo do armário teimava em esconder dos nossos olhos eternamente distraídos.

Natal, no entanto, também é uma infinidade de coisas. É cálice — dele bebemos e nos embriagamos, mesmo que no outro dia venha a ressaca. É janela e álbum de fotografia. É lágrima, quando em torno à mesa nos falta um sorriso. É riso, quando o filho desata a fita. É amor na hora do abraço. É mesa, envelope e berço. É rolha no chão, televisão desligada, cereja no bolo. Para uns, Natal é dor. Para meu pai, é festa. É luz colorida para o menino de sete anos que mira a árvore na sala de visitas. E esse menino, junto com seu irmão, para mim, é o Natal.

Como não poderia deixar de ser, estas linhas são para desejar uma Noite Feliz a todos. Que cada um esteja ao lado do seu Natal nesta madrugada de 24 de dezembro, porque no resto a gente sempre dá um jeito. Como escreveu Vinicius de Moraes: “Para isto somos feitos: para a esperança do milagre, para a participação da poesia…” E, se temos longos braços para os adeuses, que eles acenem nos muitos portos por onde nosso barco passar. Natais também são portos: no meio de um itinerário misterioso, nessa data a gente solta a âncora. Nem que seja para simplesmente olhar a paisagem da vida que vamos deixando para trás.

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