Clóvis Bulcão

Os Guinle e a música brasileira

30 / outubro / 2015

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Os Oito Batutas (Fonte: La musique bresilienne)

Recentemente, a imprensa voltou a destacar a importância de Arnaldo Guinle para o desenvolvimento da música brasileira, tema que ressaltei em Os Guinle. Mas já recebi críticas dizendo que não existe uma relação direta entre o sucesso do protegido e o empenho do mecenas. Esses críticos acreditam que o apoio financeiro não é propriamente determinante, pois quem tem talento acaba sempre se estabelecendo. Pode até ser, mas não tenho nenhuma dúvida de que um “empurrãozinho” tem o seu valor.

Pixinguinha, considerado hoje um dos maiores músicos populares do Brasil, e seus geniais parceiros Donga e João da Baiana, já faziam sucesso no Rio de Janeiro no final dos anos 1920. Com mais alguns parceiros, eles formavam o grupo instrumental Os Oito Batutas. Mas foi graças aos subsídios proporcionados por Arnaldo Guinle e o empresário Roberto Marinho, do jornal O Globo, que eles puderam se apresentar Brasil afora e no exterior.

Com esse reforço financeiro, em 1922 eles estavam, por exemplo, em Paris. Tocaram nos badalados Shérazade, Chez Duque e La Reserve de Saint-Cloud, ao lado da prestigiada Kay’s American Jazz Band. Foi uma consagração! De volta, fizeram shows em dois dos mais exclusivos clubes do país: o Fluminense e o Jockey Club do Rio de Janeiro. É claro que seu sucesso deve-se à excelência de seu trabalho, mas não dá para ignorar que antes da chancela de Arnaldo os batutas se apresentavam apenas em espaços de menor expressão, como cafés e cinemas da então capital federal.

E com o maestro e compositor Villa-Lobos, o maior nome da música do período modernista brasileiro, não foi muito diferente. Seu primeiro concerto na Europa, na Salle des Agriculteurs, em Paris, só foi possível porque o milionário brasileiro financiou sua viagem e a confecção de suas partituras na Casa Max Esching, editora francesa de renome. Mas o patrocínio logo foi encerrado por conta de desentendimentos entre Arnaldo e Villa-Lobos – que seria um tanto perdulário –, e o autor das Bachianas brasileiras voltou para casa.

Ainda na década de 1920, no entanto, agora sob os auspícios de Carlos Guinle, Villa-Lobos retomou a carreira internacional e brilhou em um concerto na Salle Gaveau, também em Paris, tendo na plateia o pianista polonês Arthur Rubinstein, o compositor francês Maurice Ravel e o compositor russo Sergei Prokofiev. No Brasil, Villa-Lobos é o responsável por uma revolução musical, ao levar temas folclóricos, indígenas e regionais para a música erudita.

Arnaldo e Carlos seguiram enriquecendo a cena cultural do Rio de Janeiro com sua ajuda. Em 1941, Arnaldo entrou para o conselho da Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB): doou uma sede para os ensaios, no Centro do Rio (avenida Rio Branco 135), e 24 instrumentos adquiridos nos Estados Unidos. Em 1961, Carlos se tornou presidente da Sociedade Brasileira de Teatro e Música. Graças a seu apoio passaram pelos palcos cariocas grandes nomes do jazz norte-americano, balés russos e importantes músicos nacionais.

Será que Pixinguinha, Donga e Villa-Lobos teriam alçado voo tão alto sem o “empurrãozinho” da família Guinle?

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