No início do século XX, o futebol ainda lutava para se firmar como esporte popular no Brasil. E, com a conquista do Campeonato Sul-Americano de 1919, realizado no Rio de Janeiro, isso começou a acontecer: a Seleção ganhou a final contra o Uruguai e o jogo caiu nas graças do povo, contagiando o país inteiro. Era também uma vitória pessoal de Arnaldo Guinle, que foi fundamental nas negociações para receber o certame e financiou a construção do estádio do Fluminense, palco da competição, em Laranjeiras.
Arnaldo acreditava no poder “civilizatório do futebol”. Ele achava que o “nobre esporte bretão” poderia ser um caminho para se educar e disciplinar os jovens. Porém, mesmo após o Brasil se tornar o país do futebol e a Copa do Mundo se consagrar internacionalmente, poucas vezes vimos o jogo como fator de civilização. Muito pelo contrário, são comuns as cenas de violência nos estádios, com jogadores usando seu fair play para levar vantagem, e as suspeitas de manipulação de resultados por máfias de apostas na Ásia. Aliás, como se sabe, a Fifa virou uma entidade de má fama.
Surpreendentemente, o meio futebolístico acaba de dar uma pequena mostra de que o sonho de Arnaldo Guinle ainda é possível. Antes mesmo de a divulgação da trágica foto do menino sírio afogado em uma praia na Turquia sensibilizar o mundo, alguns clubes na Alemanha, na Itália e no Brasil se mobilizaram para chamar a atenção para a crise dos refugiados na Europa.
Na Alemanha, o grito de apoio veio das arquibancadas. Torcidas do Wolfsburg, Frankfurt, Bayern de Munique e Borussia Dortmund prestaram sua solidariedade aos refugiados. Na Itália, alguns jogadores, como Totti, Dzeko e Pjanic, doaram camisas para serem leiloadas.
No Brasil, o Atlético Mineiro foi a primeira agremiação a se movimentar em torno da questão. Em setembro de 2014, na 19a rodada do Campeonato Brasileiro, em jogo contra o Botafogo carioca, refugiados sírios de Belo Horizonte foram convidados de honra do clube local. Foi uma atitude isolada, mas que pode representar uma esperança de que um dia o futebol no Brasil, e no mundo, seja realmente civilizatório.
Esse não é apenas o sonho de Arnaldo Guinle, mas, certamente, de todos os amantes do futebol.
Siga-nos