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BASTIDORES DO FILME “A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS”

23 / janeiro / 2014

Por Joe Utichi – www.joeutichi.com

A neve cai suavemente na rua Himmel, na minúscula cidade de Molching, na Alemanha. À medida que o espesso manto branco vai se formando, a rua começa a fazer jus à tradução de seu nome: paraíso. Mas, em janeiro de 1939, essa rua, como todas as demais na Alemanha, está sob o jugo do governo nazista, e a guerra não está longe dali. Um carro para diante de uma casinha modesta, e, do banco de trás, sai uma menina calada. Liesel Meminger pisa pela primeira vez na rua Himmel, intimidada com o novo ambiente e com seu novo lar. Da varanda da casa, Hans e Rosa Hubermann, agora pais adotivos de Liesel, observam a menina se aproximar.

Sem ser visto ou ouvido, algo mais acompanha a chegada de Liesel. A Morte já a visitou uma vez recentemente e, antes do fim da guerra, voltará a encontrá-la. Por enquanto está apenas intrigada com a menina curiosa a quem viu pegar um livro, deixado para trás por acaso por um dos coveiros que enterrou seu irmão. Liesel ainda não é capaz de lê-lo, mas essa ladra de livros logo vai descobrir o poder das palavras e que elas podem mudar o mundo.

Publicado em 2006, o livro A menina que roubava livros, de Markus Zusak, teve sua adaptação cinematográfica gravada no estúdio Babelsberg, em Berlim. A cidade fictícia retrata uma outra época e foi recriada nos seus mínimos detalhes pelo diretor Brian Percival e sua equipe talentosa, que construíram um cenário em tamanho natural para representar a rua Himmel na cidade cenográfica do estúdio.

É o auge de uma jornada que começou num café, com a produtora Karen Rosenfelt. Responsável por trazer as franquias de imenso sucesso Crepúsculo e Percy Jackson para o cinema, seu interesse por A menina que roubava livros foi despertado por um artigo do Wall Street Journal. “Imediatamente a trama me pareceu interessante”, diz Rosenfelt.

Ela procurou o livro e o devorou num único fim de semana. Pouco depois, levou o exemplar para a Fox, e o projeto foi aprovado. “Começou então uma jornada de sete anos para chegar ao ponto em que estamos hoje”, prossegue ela. “Queríamos tomar todo o cuidado porque a história era muito especial. Tivemos apenas um roteirista e um diretor trabalhando conosco durante todo o processo.”

Um ponto crucial era encontrar o diretor certo para fazer jus ao material disponível. O trabalho de Brian Percival ficou conhecido por milhões de espectadores em todo o mundo, fascinados pelo seriado de tevê Downton Abbey. Ele tinha dirigido vários episódios da primeira e da terceira temporadas, o especial de Natal em 2011, bem como o filme The Ruby in The Smoke, produzido pela BBC e aclamado pela crítica. “Brian veio aos Estados Unidos para o Globo de Ouro, por causa de Downton Abbey”, diz Rosenfelt, “nós nos encontramos e ele leu o roteiro. Nesse momento, quando falamos sobre seu trabalho, percebi de imediato que ele era um grande diretor.”

Percival diz que se interessou por A menina que roubava livros porque não se assemelhava a nenhum outro filme sobre aquele período da história. “Não queríamos fazer mais uma história do Holocausto”, insiste o diretor. “Esse filme é sobre uma menina crescendo e sobre nossa experiência humana. Uma das melhores sensações que tive enquanto lia o livro foi essa noção avassaladora do espírito humano e de tudo o que ele pode superar.”

Segundo Percival, a história ainda mostra uma nova perspectiva da Morte. “Já que a Morte é retratada num tom sutilmente divertido, e não como aquela visão aterrorizante que nos apresentam de vez em quando, muitas pessoas se aproximaram de Markus depois de ler o livro, dizendo: ‘Agora não tenho tanto medo da morte quanto antes.’”

A narração da Morte ― tão presente no livro ― também aparece no filme, mas Percival tratou de usá-la de modo esporádico para que ela não desviasse a atenção do espectador da protagonista. “Só ouvimos a voz da Morte aqui e ali, e é no espaço intermediário que efetivamente mergulhamos na vida de Liesel. No cinema é importante estabelecer a conexão entre ela e os personagens que a cercam.”

Com o filme mais focado na personagem que rouba livros e dá título ao romance, era essencial encontrar a atriz certa para o papel da jovem Liesel, e a sugestão acabou vindo de seu próprio criador, Markus Zusak. “Eu tinha visto Sophie Nélisse no filme Monsieur Lazhar”, conta ele, “e me lembro de ter dito à minha mulher: ‘Olhe, essa aí é a Liesel.’ Quando a gente olha para Sophie, simplesmente não consegue imaginar nenhuma outra atriz fazendo essa personagem.”

Nélisse fez sua estreia no cinema na produção franco-canadense Monsieur Lazhar e optou pela carreira de atriz em vez de uma promissora carreira como ginasta. “No começo eu estava mais voltada para a ginástica porque estava treinando para os Jogos Olímpicos de 2020”, disse ela. “E então, quando fiz o teste e consegui o papel, não podia recusá-lo, embora isso significasse abandonar a ginástica.”

Ela diz que Liesel foi um papel dos sonhos. “Ela é realmente forte e experimenta várias emoções diferentes. Não é um papel fácil, mas é incrível e interessante, porque ela é corajosa de verdade.”

Percival diz que Nélisse tem uma capacidade inata para se adaptar às exigências do papel, o que é bem desafiador num filme em que a personagem passa de uma menina ingênua e assustada de onze anos a uma adolescente alerta e consciente. Principalmente porque, como acontece com frequência, as cenas não são filmadas na sequência narrativa. “Ela está o tempo todo passando dos onze aos doze e aos quatorze anos”, acrescenta o diretor, “e isso acontece diariamente. Há uma diferença muito sutil entre ter doze anos e depois quatorze, mas é algo notável.”

No entanto, ao contracenar com atores bem mais experientes, como Geoffrey Rush e Emily Watson, que fazem os papéis de Hans e Rosa Hubermann, Nélisse teve a sorte de desfrutar de uma verdadeira aula. Tanto Rush quanto Watson foram as primeiras opções dos produtores, e ambos admitem que ficaram fascinados com a narrativa de Zusak.

“Markus Zusak”, diz Rush, “que é de Sidney, baseou seu romance em histórias que seus avós lhe contaram quando ele era adolescente. Eu nunca tinha ouvido falar dele e fiquei um pouco surpreso, porque pouco depois minha filha de dezessete anos veio me contar que todos os seus amigos estavam lhe dizendo: ‘Ah, seu pai vai trabalhar em A menina que roubava livros? Esse romance mudou a minha vida.’ É um fenômeno.”

“Estou empolgadíssima por fazer esse filme”, diz Watson. “Quando recebi o roteiro, achei que era um dos melhores que tinha lido nos últimos anos, e tive certeza de que era uma personagem para agarrar com unhas e dentes. Na verdade, nem precisei pensar muito a respeito.”

Desde o início da história é fácil perceber a personalidade dos pais adotivos de Liesel. Hans é a figura paterna protetora e carinhosa, que ensina à menina o poder das palavras; e Rosa, a dona de casa severa, para quem nada parece mais importante do que atribuir tarefas a Liesel. Mas quando a guerra começa, e os Hubermann recebem um novo hóspede secreto, Max Vandenburg ― um judeu refugiado ―, vemos a dinâmica da família se modificar, e a coragem e a consciência política dos Hubermann emergirem.

Foi esse momento que cativou Watson. “Começamos vendo a história pelo ponto de vista de uma criança, e Rosa é a madrasta malvada. Ela é um arquétipo. Até que acontece um momento interessantíssimo em que a história da guerra passa a ser contada pelo ponto de vista de alemães comuns, que não aderem à ideologia nazista, embora estejam envolvidos nela. No caso de Rosa, não é que ela seja particularmente radical; ela está apenas levando sua vida quando uma escolha moral bate à sua porta. Em uma fração de segundo, ela precisa tomar uma decisão sobre que caminho seguir.”

Rush reconhece de imediato que a história de A menina que roubava livros é edificante. “As coisas não deveriam ser tão difíceis e sombrias”, insiste ele. “Do ponto de vista de Liesel, é como se ela tivesse entrado num conto dos irmãos Grimm. Penetra na floresta escura da adolescência e encontra um lenhador gentil e uma madrasta bastante malvada. Então, à medida que o filme avança, espero que esses personagens evoluam e ganhem dimensões mais amplas.”

A própria rua Himmel desempenha um papel importante na história e bem poderia ser um dos personagens, por isso era tão importante para Percival encontrar o cenário adequado para contar a narrativa. Com outra equipe de peso, o diretor passou dez dias procurando locações na Alemanha, determinado a realizar toda a produção lá. “Atravessamos o país, tentando achar a cidade certa”, diz ele, “mas nunca achávamos exatamente o que estávamos procurando. Várias localidades da Alemanha Ocidental haviam sido radicalmente transformadas, e ficou difícil achar o que queríamos em termos de arquitetura.”

Havia também razões logísticas para construir um cenário no terreno do estúdio Babelsberg. Já que a maior parte do filme se passa na rua Himmel, preparar e controlar uma via pública por todo o tempo necessário para as filmagens teria sido um desafio quase insuperável. “Uma das vantagens de construir as ruas de nossa pequena cidade é que podemos, em caso de mau tempo, filmar as cenas nos estúdios. E quando se está trabalhando com crianças, essa flexibilidade é necessária.”

O estúdio Babelsberg já possuía alguns exemplos de arquitetura do período na sua cidade cenográfica. E o departamento de arte acrescentou novos prédios e ruas, para criar não apenas a rua Himmel, mas também um pequeno trecho da cidadezinha de Molching. “É impressionante entrar naquele set”, diz Zusak, que inventou a cidade de Molching e a rua Himmel especialmente para seu romance. “A primeira sensação que tive, como escritor, foi um alívio imenso por ver que a responsabilidade não era mais só minha. Entendi que sou um sortudo, e agora minha história está nas mãos de centenas de pessoas incrivelmente talentosas. Quero que elas façam dessa história sua própria obra.”

Mas, para todos os artistas envolvidos na produção do filme A menina que roubava livros, a história continua assentada nos ombros de uma garotinha que vai para a cidade cenográfica do estúdio Babelsberg filmar uma nova cena. Quando Percival grita “corta”, Rush reflete sobre o imenso talento que vê em Nélisse. “Ela é brilhante longe das câmeras, mas, diante delas, Sophie parece quase ser um filósofo existencialista, sempre na sua, vivendo um dia de cada vez. Ela lida com questões delicadíssimas, mas há coisas muito mais sutis, lindas, interessantes acontecendo em sua mente.

“A câmera simplesmente a adora.”

 

Veja aqui outras matérias relacionadas ao filme “A menina que roubava livros”:

A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS – ENTREVISTA COM MARKUS ZUSAK

A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS – ENTREVISTA COM A ATRIZ EMILY WATSON

A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS – APRESENTANDO SOPHIE NÉLISSE

 

Comentários

5 Respostas para “BASTIDORES DO FILME “A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS”

  1. ja vi o filme pela internet e eu amei mais eu quero ver ele nos cimemas vou ver ele mais de 5 veses de tao bom que é

  2. Fascinante o poder de Liesel se superar. Quando tudo parece perdido, ela de supera sempre. E como conviver e trabalhar o lado bom do ser humano e extraordináriamente compensador. Envolvente

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