O mundo dos livros

Por Leticia Wierzchowski

30 / agosto / 2013

Escrever é uma coisa que me traz alegria. Alegria e liberdade. Ora, existem situações momentosas, quando um romance emperra ou um personagem simplesmente não se adequa a nada que queremos fazer com ele, feito uma criança birrenta. Existe drama e existe exaustão no ato de escrever um livro. A insegurança também é uma espécie de horizonte para o escritor, fazendo o duplo trabalho de mantê-lo humilde e estimulá-lo em busca de avanços na sua prosa. Mas a alegria e liberdade sempre, sempre estão lá, chamando o escritor a começar de novo, e de novo, e de novo, porque sempre haverá questões que precisam de reflexão, e sempre haverá sentimentos que buscam uma válvula de escape, e sempre as palavras pululando na nossa cabeça, palavras pedindo para serem escritas, atribuídas a uma cena ou um personagem. A alegria de poder jogar o jogo, ditando as regras. E a liberdade de mudar as regras sempre que necessário. Por isso eu costumo lembrar de um poema da Nobel polonesa Wislawa Szymborska, um poema justamente intitulado “A alegria da escrita”: Numa gota de tinta há um bom estoque/ de caçadores de olho semicerrado/ prontos a correr pena abaixo, rodear a corça, preparar o tiro./ Esquecem-se de que isso não é a vida./ Outras leis, preto no branco aqui vigoram./ Um pestanejar vai durar quanto eu quiser,/ e se deixar dividir em pequenas eternidades/ cheias de balas suspensas no voo.

Escrevo para fugir da realidade, escrevo para consertar a realidade. Escrevo para apagar, debochar, dilatar ou eternizar a realidade. Escrevo quando a realidade me esmaga e me esfola. Escrevo quando a realidade me abre os olhos, escrevo para fechar os olhos à realidade. E nisto, no exercício de escrever sobre tudo ou sobre nada, é que consiste a minha inalienável liberdade. Escrevo para sonhar. E leio. Leio porque outros escreveram por todos os motivos que citei acima, ou por nenhum deles, talvez. Seguindo o fio de uma boa narrativa você vai do céu ao inferno: o mundo dos livros é um mundo de êxtase e de liberdade total, você pode ser infinitas pessoas nesse espaço onde o tempo e as fronteiras geográficas desimportam. No mundo dos livros, vocês e eu, eles e nós, não somos africanos, católicos, pobres, machos, muçulmanos, brancos, judeus ou feministas – somos apenas seres humanos.

Leia outras colunas da autora:
Tigres em dia vermelho
A alegria da escrita
Dois livraços
A história dos caroços
Um verão indiano
Tudo junto e misturado
O mais bonito 

Conheça os personagens de Sal, o novo romance de Leticia Wierzchowski:

Ivan, por Cecília
Orfeu, por Ivan
Julius Templeman, por Orfeu
Flora, por Julius
Tiberius, por Flora
Lucas, por Tiberius
Eva, por Lucas
Julieta, por Eva
Doña, por Julieta
Ernest, por Doña 

Leticia Wierzchowski nasceu em Porto Alegre e estreou na literatura aos 26 anos. Já publicou 11 romances e novelas e uma antologia de crônicas, além de cinco livros infantis e infantojuvenis. É autora de SalNavegue a lágrima e de A casa das sete mulheres, história que inspirou a série homônima produzida pela Rede Globo e exibida em 30 países.
Leticia escreve às sextas.

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Comentários

2 Respostas para “O mundo dos livros

  1. OI rs eu estive na bienal no sábado (31/08) e a querida Letícia autografou o livro Sal para mim, acabou que só depois me toquei que tinha sido ela a escrever o livro que deu origem a serie da globo “a casa das sete mulheres” que eu amo de paixão xD Tinha dito a ela que talvez eu iria adorar seu livro “sal” e realmente estou, mas você, letícia, é realmente uma das melhores escritoras que já tive o prazer de conhecer a obra!
    um grande abraço, Bárbara.

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