Ao Psicopata por quem um dia me apaixonei.

Ao Psicopata por quem um dia me apaixonei.

Oi, ex-namorado

Tudo bem? Escrevo esta carta como forma de profilaxia. Foi uma medida que tomei para poupar-me da frustração. Às vezes, tenho medo de me sufocar com tantos pensamentos, e por isso, decidi abrir meu coração. Essa não será mais uma daquelas cartas de amor que escrevi e logo em seguida, guardei num baú esculhambado junto a todas as outras que nunca enviei. É um desabafo. É a história da minha vida. Por favor, leia com atenção. E se prepare, por que lá vem textão.
Ultimamente andei pensando em você. Sei que não devia, mas, chega uma hora que cansamos de nos reprimir. Pois é, a minha hora chegou. Depois de muito tempo, finalmente tomei coragem de contar tudo e me libertar de uma vez por todas dessa mágoa que aos poucos, corrói a minha essência. Preciso te contar umas coisinhas que há muito tempo escondi.
Eu não te odeio mais. Acredite, não odeio, não! Aqueles chifres que você me colocou, aquelas mentiras todas que você contou... Tudo isso não me abala mais. E quantas crises existenciais não tive de enfrentar para eu finalmente perceber que nada, nada disso vale a pena? Não preciso ser só a ex-namorada psicopata de um psicopata pior ainda. Viver num passado distante, te odiar a vida inteira por algo que já se foi? Nada disso é preciso. Já chega! Não quero carregar esse peso por tantas outras vidas que terei de viver até poder evoluir. E se um dia a gente se encontrar e você me perguntar o que sinto, te responderei com um sorriso no rosto: "NADA!". Não existe mais ódio, não existe mais rancor... e depois de tudo que passamos, nem amor restou. Não há como amar alguém que tanto me fez sofrer. Perdoe-me, mas você não merece.
Passei um longo tempo para poder acreditar que aquela pessoa por quem um dia eu me apaixonei, não passou de uma ilusão. Uma idealização minha. E como me martirizei por não ter acreditados nos meus amigos desde o princípio! Eu que tanto os julgava, não conseguia perceber que a única cega da história era eu mesma. Demorou para finalmente cair a ficha de que você não era mais aquele menino por quem meus olhos tanto vidravam. Aquele que me trazia uma paz imensa, me dava conforto e muito orgulho. Demorei também para acreditar que aquele nosso conto de fadas era só mais uma mera utopia. Namoro? Nunca existiu! Se é que podemos chamar uma relação mórbida e cheia de mentiras, de um namoro feliz. Por que pelas minhas costas, para você pouco importava. Eu só fui mais um dos seus namoros descartáveis, desses que as pessoas usam e depois jogam fora, como se fossem simples mercadorias. Lamento muito por tudo o que aconteceu. Lamento por ter sido tão boba. Mas ao mesmo tempo em que sinto essas coisas, meu corpo divide um outro sentimento na mesma intensidade e proporção: Gratidão.
Por favor, não me ache uma dessas meninas fúteis e superficiais, que estão dispostas a infernizar a vida do ex-namorado a todo custo, fingindo está bem, quando na verdade, está desabando de tanta tristeza. Você sabe, não sou dessas que fingem ser o que não são. Quando digo que não te odeio mais, é por que não odeio meio. Sou muito grata por tudo. Por cada lágrima que derramei, por cada choro que tentei conter, por cada euforia que passei ao te ver fazendo coisas horríveis, mas mesmo assim, ficar calada. Muito obrigada por ter sido o primeiro grande amor da minha vida. A primeira e a mais dura decepção. Por essas e outras coisas, eu sou grata.
Aprendi que para cada desilusão, há um aprendizado. Esse foi o meu, o maior de todos os outros que a vida me deu: Nunca confiar de cara em qualquer babaca que apareça de repente, te diga coisas lindas, juras de amor eterno, clichês, mas que depois, como se não significasse mais nada, te trai. Trai da maneira mais desagradável, mais sórdida, com os artifícios mais baixos que alguém poderia usar. Trai com uma, duas, três... dez ao mesmo tempo. Trai com as meninas do colégio, de outras cidades, e até de outros estados. Você serve de marionete, faz coisas absurda por amor, fica com a reputação manchada, carrega dia após dia um título merecido. Burra, besta, prostituta, e tantos outros pejorativos que os "faladeiros" usam para tratar uma menina que amou. Esse foi o meu erro. Amei demais quem nunca me mereceu.
Você não sabe o que é ter que viver com a culpa das loucuras que fiz por você. Não sabe o que foi chegar nos lugares e ter de encarar os olhares constrangedores daqueles que não me conheciam, mas que mesmo assim, me apunhalaram sem dó, me xingaram de coisas que eu não sou, e não me pouparam de nada. Como aquilo me magoou! Você não sabe o que é ter de suplicar ao diretor do colégio para não convocar meus pais, por que é claro, numa sociedade tão machista como essa, é sempre a mulher que paga. Essas coisas doem muito, sabia?
O pior de tudo, é que ainda penso em você. Não mais todos os dias, nem o tempo inteiro, mas, ainda é mais do que eu gostaria. Já faz tempo, mas sei exatamente como tudo aconteceu. Um belo dia, o amor bateu em minha porta. Tentei, tentei, e depois, tentei mais um pouco resistir. Mas chegou um momento, o estopim, que não mais consegui. Sem mais nem menos, comecei a te amar. Então, nós dois vivemos momentos incríveis. Um tanto piegas, mas que para mim, eram sempre especiais. Cada olhar, cada sorriso seu, era tudo mágico aos meus olhos. E eu, que sempre fui tão certinha, tão racional, me vi perdida, sem rumo, sem chão, com o mundo todinho traçado em função do seu. Fizemos planos de casar, ter três filhos (Eu até concordei em colocar aquele nome ridículo na nossa filha), ter um labrador, montar um abrigo para cachorros, viajar num carro Jeep e fazer mochilão pela Europa. Foi meu primeiro namorado, primeiro grande amor e até primeiro futuro marido. E eu juro, cheguei a acreditar que tudo isso seria para sempre.
E aí, as coisas foram desandando. Você não me ligava mais de manhã somente para ouvir minha voz, não falava mais comigo até tarde, não me chama daqueles apelidos carinhosos, não me dizia mais que me amava. Mas tudo bem, eu deixava levar, pois afinal, eu só era aquela menina inexperiente e achava que não seria feliz com mais ninguém que não fosse você. Como eu te amava! E por causa desse amor, eu comecei a aceitar até os seus defeitos, e foram muitas mancadas, viu? Mas chegou uma hora que eu não pude mais sustentar aquela pirâmide. Você nem me respeitava mais. Nem ligava mais para a minha opinião. Não se importava se eu estava bem. Era só como você queria. Eu era novinha demais para entender que os primeiros namoros raramente duram a vida inteira. Preferi alimentar a ideia de que tudo seria eterno. Só que eu cansei. Aliás, fora inevitável não me cansar. Eu já sabia que as coisas não estavam bem. Nossos olhos nem se encaravam mais numa perfeita sintonia. Eu nem me arrepiava mais ao estar pertinho de você. Nem sentia mais aquela sensação de ter um objeto frenético dentro de mim, a cada beijo que trocávamos, cada vez que você pegou nas minhas mãos. Foi bom, né? Foi bom se divertir comigo. Eu só era mesmo aquela boba que você enganava. Eu era aquela que acreditava na bondade das pessoas, só precisava de uma boa lábia para ser enganada, e você, inacreditavelmente consegui me convencer como ninguém mais conseguia. Seu poder de persuasão era surreal. Dizem que é sofrendo que aprendemos as maiores lições. De uns tempos para cá, comecei acreditar nessas frases feitas, pois afinal, foi sofrendo que moldei a pessoa que hoje sou.
Eu te odiei tanto, menino. Nem imaginava ser capaz de guardar tanto rancor. Odiei cada minuto que em que fui obrigada a ficar ao seu lado no colégio, te vendo dar em cima das meninas, inclusive amigas minhas, só para fazer questão de eu me sentir culpada por não te ter mais ao meu lado. Odiava aquele sorriso irônico que você usava para me provocar. Minha vontade era te bater até você aprender a não mais usar as pessoas. E por um longo tempo, meu maior prazer era finalmente poder entrar em casa, já que lá era o único lugar em que eu me sentia mesmo segura. Logo eu, que sempre amei ir ao colégio, todos os dias eram infinitas batalhas. Não aguentava mais ser torturadas por um psicopata. Até fingi para mim mesma que eu não mais me importava, mas é claro, era tudo mentira. Eu me importava, sim. Não suportava aqueles seus olhares, aquelas suas mensagens, ligações... Fazia-me sentir num campo de concentração. E em casa, eu chorava. Trancava-me no quarto, chorava noite e dia e dia ouvindo músicas que nem gosto de lembrar. Meu rendimento escolar caiu, perdi alguns quilos e até me recusei a novamente me apaixonar.
Pensei em abrir o jogo com meus pais. Talvez eles entendessem o motivo de eu odiar ir ao colégio, mas pensei melhor e preferi ficar na minha. Seria duro demais para mim, ver meu pai sofrendo com a dor da princesinha dele, a menina que ele tanto ama. Imagino que seja difícil colocar filhos no mundo para depois, sem mais nem menos, vir um babaca e fazê-la sofrer como você me fez. Tentei poupá-los de um sentimento, e por isso, a dor foi toda despejada em cima de mim.
Era tão difícil sorrir para minha família, amigos, quando dentro de mim, eu escondia aquele sofrimento. Tinha alguém me perseguindo e eu já estava me sufocando. E em um daqueles dias ruins, eu não consegui me conter. Chorei. Chorei no colégio, na pior hora, no pior lugar. Quando me dei conta, minha prova já estava encharcada de tantas lágrimas. Meu soluço já era ouvido por toda a sala. Era incontrolável. Ninguém sabia o que estava acontecendo. Ninguém pudera imaginar o que eu estava passando. Eu precisava de ajuda. E rápido! Tive de sair da sala, perdi provas e depois me ferrei. Seria mais fácil se eu não tivesse te amado tanto.
Cheguei a elaborar uma doença psicológica que só eu sofria. A Cafajestofobia, conhece? É o medo de Cafajestes. Seus portadores sentem náuseas, ficam trêmulos com a ideia de está pertinho de um deles. Ficam debilitados e até imóveis. Têm surtos de histeria ao vê-lo com outra. Era o que eu sentia.
O tempo foi passando. Você saiu do colégio, saiu da minha vida... quer dizer, eu te expulsei dela. Fui aprendendo a lidar com o acontecido, e a não me culpar tanto. Aos poucos, fui voltando a sorrir. Fui conhecendo pessoas, e você, enganando outras. Eu parei com aquela psicopatia de querer te ver sofrer. Até parei de usar outros meninos para tentar te esquecer. Dei um tempo para mim, reconstruí a minha vida, e olha só para mim agora.
Fiquei me sentindo mal por ter te odiado. Achei que você precisava saber que eu não sou mais aquela louca desequilibrada que fazia de tudo para infernizar a sua vida. Eu não te odeio mais.

A Psicopata que um dia te amou.

Sabrina Dias

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