Artigos

Literatura, reggae e o tiro que quase matou Bob Marley

27 / junho / 2017

Por Thadeu C. Santos*

Breve história de sete assassinatos é o primeiro livro do escritor jamaicano Marlon James a ser publicado no Brasil. Na obra, James construiu uma narrativa tão impressionante e original que recebeu o Man Booker Prize, o principal prêmio da literatura britânica e um dos mais reconhecidos da literatura internacional. O feito é mesmo prodigioso: foi a primeira vez que um escritor jamaicano levou a premiação.

Oferecendo espaço para que os personagens se manifestem em primeira pessoa a cada capítulo, o autor retrata os antecedentes e as consequências de um importante acontecimento da história recente da Jamaica ao recriar um fato real: o atentado sofrido por Bob Marley, maior estrela do reggae, dois dias antes do show Smile Jamaica, realizado em 5 de dezembro de 1976 no National Heroes Park, em Kingston, junto com sua banda The Wailers.

Era ano eleitoral e a apresentação continha uma mensagem política: Marley, que àquela altura já era considerado uma figura mítica pelos jamaicanos, subiria ao palco numa das principais praças da capital para clamar pelo fim da matança que envolvia jovens militantes dos dois principais partidos políticos do país. Marley não deu ouvidos aos que diziam que ele poderia ser morto no palco e cantou para a multidão. Em determinado momento, mostrou a ferida deixada em seu peito pela bala de raspão e o curativo no braço esquerdo, expondo ao público onde fora perfurado.

No ano seguinte, Bob Marley & The Wailers gravariam Exodus, e a música nunca mais seria a mesma. O reggae se tornou a cada novo disco um gênero musical mais politizado, que refletia a visão de mundo dos rastafári e seguia a trilha iniciada pelo rocksteady de unir música, religiosidade e ativismo por justiça social. No entanto, nem todos os jamaicanos eram rastas e nem todos gostavam de reggae. Nos anos 1970 e 1980, em meio à resistência pacífica encampada por músicos ativistas, a realidade de Kingston seguia dura, imersa na pobreza e extremamente violenta. A política era um fator de instabilidade que contribuía para que gangues de traficantes de drogas tomassem conta das favelas de Kingston e… de áreas em Nova York onde gangues de jamaicanos disputavam entre si importantes pontos da cidade mais famosa do mundo.

Esse é o cenário de conflitos políticos e sociais que os personagens de Marlon James expõem em seus relatos, muitas vezes se valendo de hits da época. Alguns deles seguem na playlist abaixo, com algumas das gravações citadas no romance. São músicas que trazem na essência o que aqueles anos significaram. Além de Bob Marley, também marcam presença Delroy Wilson, Big Youth, Sista Nancy, Might Diamonds, entre outros, compondo um panorama de peso da fase seminal do reggae.

>> Breve história de sete assassinatos chega às livrarias a partir de 6 de julho e já está em pré-venda.
>> Marlon James participa da Festa Literária de Paraty 2017

 

Thadeu C. Santos, 30 anos, é editor freelance. Esteve em Kingston, capital da Jamaica, em 2013, durante uma viagem de 8 dias, ou seja, pouco tempo para entender tudo o que estava acontecendo por lá, mas o suficiente para desconfiar que algumas coisas eram muito similares à realidade do Rio de Janeiro, onde vive.

Comentários

2 Respostas para “Literatura, reggae e o tiro que quase matou Bob Marley

  1. A jamaica teve um lado obscuro, basicamente por questões políticas e sociais, o trajeto da maior lenda do reggae é outro ponto atrativo no livro que nos atrai de vez a uma jornada eletrizante e memorável na história de MARLON JAMES. Só o parabenizo por tamanho grandeza produzida e atingida, ganhando um dos maiores prêmios da literatura.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *