testeA nova mitologia de Deuses americanos

Por Alexandre Matias*

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Ainda não chegou o tempo em que olharemos para trás e reconheceremos que Deuses americanos foi um marco na literatura fantástica mundial. O livro que lançou a carreira de Neil Gaiman como escritor para além dos quadrinhos completa quinze anos em 2016, e sua adaptação para série de TV já está sendo filmada e estreia em 2017. O aniversário traz de volta a versão integral que Gaiman mandou a seu primeiro editor, que podou dezenas de páginas. Nessa  Edição Preferida do Autor as páginas extras são resgatadas, além de outros textos de Gaiman sobre o livro, como uma nova introdução e uma entrevista.

Em Deuses americanos, Gaiman explora a possibilidade de mitologias acompanharem seus povos em migração. A história se passa na virada do milênio, mas também volta no tempo para mostrar os Estados Unidos em formação, explicando como cada povo e cada tribo deixou a Europa rumo à América levando consigo suas crenças — e como estas foram se transformando no novo continente, que, ao mesmo tempo, via o nascimento de novos deuses.

Assim como acontece na extensa saga em quadrinhos Sandman, publicada entre 1989 e 1996, a sombra que Deuses americanos projeta sobre a fantasia atual ainda está em lento crescimento, sendo apresentada a novos públicos e espalhando-se para além daquele momento inicial de seu lançamento.

Na nova introdução, Neil Gaiman explica que concebeu o título do livro antes mesmo de saber sobre o que escreveria. E, ao apresentá-lo para sua editora, recebeu de volta uma capa já pronta com a clássica imagem do relâmpago ao longe, no horizonte de uma estrada. A imagem icônica surgiu antes mesmo de Gaiman determinar exatamente qual história queria contar e qual tom daria à nova saga.

De certa forma, Deuses americanos pode ser visto como uma continuação do universo que Gaiman começou a explorar em Sandman, embora por outro ponto de vista. Com a série da DC Comics, o autor britânico escolheu um personagem de terceiro escalão da editora e foi em sua essência, descobrindo que o nome Sandman estava vinculado ao personagem do sonho em todas as mitologias. Criou um universo no qual sete irmãos — os Perpétuos — atravessam todas as narrativas da história humana. Eles são entidades que existem desde a aurora dos tempos — Destino, Morte, Sonho, Destruição, Desejo, Desespero e Delírio (todos com D, em inglês) — e cuja interação afeta diretamente a vida dos seres humanos. Sandman era um enorme xadrez da eternidade, em que diferentes deuses e personagens fantásticos brincavam com a mortalidade humana.

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Deuses americanos nos faz ver esses universos mitológicos do ponto de vista mortal. O protagonista, Shadow, cruza os Estados Unidos de carro em busca de divindades de outras culturas que estiveram na base da formação do país, mas que aos poucos foram perdendo a importância, ao mesmo tempo em que viram o nascer de novos deuses, aqueles que batizam o livro. E, mesmo que tenha uma história fechada, o universo de Deuses americanos acabou por invadir e dar origem a outros livros de Neil Gaiman, que aos poucos vai desenhando seu próprio universo ficcional.

A adaptação do livro para a TV amplia ainda mais as fronteiras desse universo. A princípio produzida pela HBO, a série passou para o canal fechado Starz e conta com nomes como Bryan Fuller (da série Hannibal) e Michael Green (que fez Heroes e Kings e atualmente produz Gotham e escreve a continuação de Blade Runner), além do próprio Neil Gaiman, que acompanha de perto o projeto desde o início. Gaiman já admitiu ter participado do roteiro dos primeiros episódios da série, que teve seu primeiro teaser exibido — e recebido com aplausos — na Comic Con de San Diego deste ano, o principal evento de cultura pop do mundo.

Ao chegar à TV durante uma grande entressafra que coincide com a fase final do fenômeno de fantasia Game of Thrones, há uma grande chance de a série encontrar um público ávido por novas histórias que misturem mitologia e realidade. Em Deuses americanos, assim como em toda obra de Neil Gaiman, os fãs encontrarão um enorme manancial de contos, fábulas e épicos.

Mas ainda há muito pela frente. Outras obras fantásticas — como O senhor dos anéis, Harry Potter e o próprio Game of Thrones — só atingiram o auge da popularidade quando saíram do papel e chegaram às telas do cinema e da TV, sendo que apenas os autores dos dois últimos — J.K. Rowling e George R.R. Martin — puderam curtir o ápice de popularidade e alcance de suas criações, ajudando-as a crescer nesta transição. A nova edição de Deuses americanos e a iminente série são as primeiras provas de que esse universo pode — e deve — ser bem explorado nos próximos anos.

 

Alexandre Matias, 41 anos, é jornalista e cobre cultura e tecnologia há vinte anos, com base em seu site, Trabalho Sujo (www.trabalhosujo.com.br).

testeIntrínseca na Comic Con Experience 2016

Sim, queridos leitores! Pelo segundo ano consecutivo esperamos encontrar vocês na Comic Con Experience, grande celebração do universo geek e da cultura pop que acontece de 1 a 4 de dezembro no São Paulo Expo (antigo Expo Imigrantes). #VaiSerÉpico

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Nessa edição, nosso estande terá o dobro do tamanho e a galera do Papo Nerd no Estoque vai sair do Snapchat para conversar sobre nossos lançamentos no sábado, 3/12, às 16h, direto do nosso estande!

 

Mas se você ainda não está de malas prontas para a CCXP, temos mais uma novidade:

O bate-papo será transmitido, ao vivo, pelo nosso Facebook e as aventuras dos nossos nerds pelo evento serão registradas nos nossos perfis do Instagram e do Snapchat (ed.intrinseca).

 

Se você precisa de mais razões para não deixar de nos visitar na CCXP, aqui vai o ultimato! Nosso estande estará muito especial (surpresa!) e todos os nossos livros terão preços especiais. Entre eles, a coleção completa da série O lar da srta. Peregrine para crianças peculiares, História da sua vida e outros contos, livros de Neil Gaiman, como o lançamento Deuses Americanos, O martelo de Thor e todos os livros de Rick Riordan, Nimona, Welcome to the Night Vale, o quebra-cabeça literário S., de J.J. Abrams, a trilogia Comando Sul, os livros de Stephen Hawking e muito mais!

 

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Visite a Intrínseca na CCXP 2015

Nosso estande ficará na Moby Way – 42b
A CCXP acontece na Rod. dos Imigrantes, Km 1,5 – Água Funda, São Paulo.

Horários:
Quinta-feira, 01/12 – 12h às 22h
Sexta-feira, 02/12– 10h às 22h
Sábado, 03/12– 10h às 22h
Domingo, 04/12 – 10h às 20h

A gente se vê lá?

testeHidra de três cabeças? Dilma, Lula, e Trump

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A Hidra de Lerna da políitca americana: Donald Trump. (Fonte)

Diz-se que a Hidra de Lerna é uma serpente com múltiplas cabeças e que, se, porventura, uma delas for cortada, nascem outras duas em seu lugar. A Hidra de Lerna, assim como outros seres exóticos, habita o universo de O livro dos seres imaginários, de Jorge Luis Borges, um de meus escritores prediletos.

Por que, porém, falo da Hidra? Afinal, pediram-me que escrevesse uma coluna sobre a borboleta-azul. Explico.

Tenho pensado muito na eleição de Donald Trump aqui nos Estados Unidos. Tenho refletido sobre o que o presidente eleito revelou até agora sobre sua personalidade, suas preferências e seus planos econômicos. Cheguei à conclusão de que ele é como a Hidra de Lerna: uma criatura que tem a cabeça de Collor, a cabeça de Lula e a cabeça de Dilma.

 

A cabeça de Collor

Trump nasceu rico, como Collor. Durante sua campanha, prometeu “drenar o pântano de Washington”, livrando-se das grandes corporações e dos lobistas que influenciam políticos por interesse próprio. Espécie de caçador de marajás à americana. Trump não quer morar na Casa Branca, a residência oficial, embora tenha de fazê-lo ao menos durante parte da semana. Nos fins de semana, talvez possa retornar à sua casa da dinda: a Trump Tower, em Manhattan.

A cabeça de Lula

Ao longo de toda a campanha, Trump prometeu lutar pela classe trabalhadora americana, os supostos destituídos pela globalização. Como todo líder populista, valeu-se da retórica nós contra eles. Portanto, teve de identificar quem eram “eles”. Os “eles” de Trump dividiam-se basicamente em dois grupos, não mutuamente excludentes: as elites corruptas, ou a zelite, e a mídia mentirosa, ou a mídia golpista. O presidente eleito também salientou, em diversas ocasiões, que “ama aqueles que têm pouca educação”. Carismático e de fala simples, incendiou paixões e multidões, como o “filho do Brasil”.

A cabeça de Dilma

Finalmente, depois desse preâmbulo, chego à borboleta-azul. No livro, destaco algumas políticas adotadas por Dilma que beneficiaram mais os ricos do que o povo: a bolsa empresário do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), as desonerações para recuperar a irrecuperável indústria nacional, os planos mirabolantes de investimento em infraestrutura — como o Plano Brasil Maior e o Plano de Investimento em Logística —, as medidas protecionistas que garantiriam o ressurgimento da indústria ao reservar o mercado local para as empresas nacionais.

Trump promete resgatar a indústria e aumentar a disponibilidade de empregos. Almeja fazê-lo por meio do protecionismo, dos investimentos em infraestrutura, dos cortes de impostos para as empresas, sobretudo para as maiores. Trump, na economia, tem, inequivocamente, a cabeça de Dilma, cérebro da Nova Matriz. Há inclusive planos para “reformular o Federal Reserve” (FED, o Banco Central americano). Talvez o tornando mais politizado, como fez Dilma? A ver.

 

Hidra de Lerna, borboleta-azul, laranja mecânica: essa história não deve acabar bem.

>> Leia um trecho de Como matar a borboleta-azul: Uma crônica da era Dilma

testeA história de A química

Após seis anos sem publicar uma obra inteiramente inédita, Stephenie Meyer retornou com o thriller A química, surpreendendo a todos com um livro completamente diferente de tudo que já havia publicado. A obra, na realidade, começou a surgir durante o encerramento das gravações de Amanhecer.  Confira a jornada da ideia original ao livro final pela autora:

testeA Chegada: até onde vamos para entender o diferente?

*Por Bruno Machado

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Cena de A Chegada (Fonte)

Quando fomos informados de que A Chegada, adaptação de um dos contos da coletânea História de sua vida e outros contos seria o filme de abertura do Festival do Rio de 2016, a reação na editora foi de grande surpresa. Não pela qualidade do texto que serviu de inspiração para a produção cinematográfica, e sim pelo fato de um filme de ficção científica ter sido escolhido para a sessão de gala do festival.

frente_historia-da-sua-vida_pt-br-pNão é uma declaração bombástica dizer que a ficção científica é um gênero de nicho, seja ele literário ou cinematográfico. Claro, muitas pessoas consideram Star Wars ficção científica, mas não basta para o sci-fi que uma história seja contada no espaço. A saga da família Skywalker é muito mais próxima de uma fantasia que aconteceu “Há muito tempo atrás, em uma galáxia distante”.

Animada com o prestígio dado ao filme, lá foi a equipe da Intrínseca para a Cidade das Artes, assistir ao filme em meio a atores globais e toda sorte de profissionais do cinema nacional. Dirigido por Denis Villeneuve (de Sicario: Terra de Ninguém e Os Suspeitos), a produção já surpreende nos primeiros minutos. Não há naves espaciais bonitas, alienígenas assustadores nem um discurso emocionante do presidente dos Estados Unidos no Quatro de Julho. A Chegada é basicamente uma história sobre mãe e filha.

No filme, doze objetos voadores não identificados que se assemelham a gigantescos monólitos ovais surgem em cantos aleatórios do planeta. A chegada das naves não é detectada por nenhuma agência do mundo, e elas se mantêm impressionantemente estacionadas no céu, como se esperassem por algo. Rapidamente os governos dos países “visitados” começam a tomar providências, e China e Rússia são as duas nações mais propensas a atacar primeiro e perguntar depois.

Enquanto isso, nos Estados Unidos, uma linguista – interpretada por Amy Adams, que aparentemente vai estrelar todas as adaptações dos livros da Intrínseca (vide Tony & Susan que se chamará Animais Noturnos, e Objetos cortantes) – é convocada para ajudar a decifrar o que as criaturas pretendem em nosso planeta. Ao longo da história, vemos como seria o trabalho de tentar entender criaturas que não pensam, não se comportam e nem parecem conosco. E quanto mais próximo da grande revelação do filme – que não falaremos aqui, obviamente –, mais percebemos que as criaturas sequer existem da mesma forma que nós. E apenas a linguista parece compreender isso, com consequências surpreendentes para a trama.

Como assisti ao filme antes de ler o conto “História da sua vida”, a reviravolta do enredo me pegou completamente de surpresa. É daqueles momentos como em O Sexto Sentido, Planeta dos Macacos ou Clube da Luta, no qual uma revelação muda sua ideia do filme por completo. E a forma como Chiang faz isso na prosa e Villeneuve no filme são igualmente emocionantes. Foi impossível chegar ao fim da sessão sem ficar com os olhos cheios d´água, precisando de um tempo para pensar na experiência que acabou de acontecer, como em outro recente sci-fi, Interestelar.

Uma das principais características da ficção científica é provocar reflexão. Seja ao atravessar um buraco de minhoca para encontrar um novo mundo para a raça humana ou tentar entender o incompreensível, o gênero é responsável por nos fazer pensar em limites. Até onde você estaria disposto a ir para entender o diferente? Quanto você gostaria de aprender para ser alguém melhor? Seja em A Chegada, “História da sua vida” ou nos outros contos da coletânea de Ted Chiang, boas histórias definitivamente nos tornam pessoas melhores.

> Leia um trecho de História da sua vida e outros contos.

 

* Bruno Machado é assistente de mídias sociais no departamento de Marketing e acha que só faltam alienígenas aparecerem por aqui para 2016 ser o ano mais louco de todos os tempos.

teste5 curiosidades sobre A química, novo livro de Stephenie Meyer

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Stephenie Meyer (Fonte)

Pegando todos de surpresa, a autora da série Crepúsculo e A hospedeira anunciou em julho que em novembro teríamos um livro inédito, completamente diferente de tudo que ela já havia feito em sua carreira. Em A química, somos apresentados a uma heroína poderosa e fascinante.

Para celebrar o lançamento, selecionamos 5 curiosidades sobre o novo livro de Stephenie Meyer:

1- A ideia para A química surgiu originalmente em 2010, durante as gravações de uma cena noturna de Amanhecer – Parte 1. Enquanto tremia de frio, a autora teve a primeira ideia de uma agente secreta com talentos peculiares para a tortura.

2- O livro é dedicado ao personagem Jason Bourne, e a razão é muito simples: depois de sua primeira ideia para a protagonista da história que viria a se tornar A química, Stephenie Meyer explorou ainda mais o gênero da futura obra ao presentear uma amiga com a sua primeira (e até o momento, única) fanfiction: um final alternativo para a série de livros e filmes do agente desmemoriado.

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Jason Bourne (Fonte)

3- Um dos hábitos que a autora mantém desde que começou a escrever a série Crepúsculo é escrever de madrugada. O primeiro rascunho de A química surgiu em um período contínuo das 21h às 3h da madrugada.

4- A autora precisou de uma consultoria incomum: como matar e ferir pessoas de formas criativas. Em entrevistas, Meyer diz que se seu histórico de buscas no Google fosse investigado, ela provavelmente seria presa. Para facilitar o trabalho, entrou em contato com diversos especialistas em campos como criminologia e bioquímica.

5- Quando perguntada sobre novos projetos, a autora tem notícias não muito boas para aqueles que ainda esperam por Midnight Sun: ela não pretende voltar ao universo de vampiros e lobisomens tão cedo. Uma das ideias que ela considera após A química é escrever um livro de fantasia épica, em um mundo de trevas e magia.

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Uma fantasia épica de Stephenie Meyer? (Fonte)

testeUm novo clássico para meninas fortes

Por Fabiane Pereira*

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Provavelmente você já ouviu falar de As mil e uma noites, um clássico da literatura mundial que reúne histórias e contos populares originários do Oriente Médio e da Ásia Meridional, remontando até o século IX. Aqui no Ocidente, a obra se tornou um best-seller da literatura universal com a tradução de Antoine Galland para o francês, em 1704. As várias histórias desse clássico estão no imaginário coletivo de todos, por isso arrisco uma provocação: pago para ver quem, ainda na infância, não ouviu falar sobre Ali Babá e os quarentas ladrões, Aladim e o gênio da lâmpada ou sobre a espertíssima Sherazade, que dribla a morte narrando (bons) contos.

Em As mil noites, reconto de Emily Kate Johnston recém-lançado pela Intrínseca, a história se repete, mas de forma diferente. E não é à toa: além de escritora, E. K. Johnston é arqueóloga, já morou em quatro continentes, se especializou em árabe e hebraico bíblicos e fez pesquisa de campo no deserto! É exatamente essa familiaridade com o cenário da obra original que a ajudou a construir a nova narrativa. Assim como na história de Sherazade, Lo-Melkhiin (o rei desta história) é bom para seu povo, ao contrário de seu pai. Porém, quando se casa pela primeira vez, com direito a uma grande festa, sua esposa morre na noite de núpcias.

O fato ocorre inúmeras vezes, até que suspeitas começam a ser levantadas e o povo começa a temê-lo. Importante ressaltar que, exceto por Lo-Melkhiin e pouquíssimos outros personagens, nenhum nome é revelado ao longo do livro, mas a escrita é amarrada de forma tão precisa que só notamos isso quando finalizamos a leitura. A história de As mil noites começa quando Lo-Melkhiin parte em busca de sua futura rainha, após ter matado trezentas. Temendo pela irmã, que é a menina mais bela de sua aldeia, a protagonista do livro — cujo nome não é revelado — faz de tudo para ser levada no lugar dela.

As duas são muito próximas e fazem tudo juntas. Nos dias de hoje, talvez pudéssemos dizer que elas compartilhavam do princípio da “sororidade”, palavra introduzida no vocabulário pelo movimento feminista contemporâneo. Aqui, abro parênteses para explicar melhor esta questão tão atual e importante: o feminismo é uma luta pela igualdade de direitos entre homens e mulheres. É uma luta em prol das mulheres, devemos nos unir, e não competir umas com as outras. A competição nos separa. Sororidade é a tradução de “sisterhood” ou irmandade, em inglês. É a possibilidade de ver outras meninas como “manas”, aliadas, e não como concorrentes ou inimigas.

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Por isso, quando Lo-Melkhiin aparece na sua tribo para levar a próxima rainha para o palácio, ela, que não era tão radiante quanto a irmã, se arruma deslumbrantemente e, ao encontrar o rei,  acaba sendo a escolhida.

Eis o arco dramático do texto: a rainha agora precisa se manter viva. Ela sabe que as ex-esposas não foram rainhas por mais de dois ou três dias e está disposta a quebrar esse ciclo, apesar de ter consciência de que a morte está à espreita. Noite após noite, o rei vai ao quarto dela ouvir suas histórias, e dia após dia ela continua viva e cada vez mais forte. Durante os momentos que passam juntos, nossa protagonista se fortalece, e suas histórias começam a ganhar vida própria.

Abro aqui outro parênteses para dizer que a autora optou por uma narrativa que estimula (e muito!) a viagem proporcionada por uma boa leitura. Emily Kate Johnston constrói uma trama que entrelaça ciência, magia, mitologia árabe, religiosidade e o poder de realização. O leitor sente o imenso amor da rainha pela irmã, a raiva pela sua situação, suas frustrações e a força oriunda das mulheres que, mesmo menosprezadas, resistem e se fortalecem.

Conforme o tempo passa e a nova rainha continua viva, ela fica cada vez mais confiante em seus poderes, e os súditos do reino passam a confiar e a depositar nela suas esperanças para as tão esperadas melhorias sociais. Ao perceber que a “magia” está dentro dela, a rainha percebe que pode desafiar até mesmo um rei. Tiramos daí uma importante lição, meninas! Quanto mais empoderadas ficamos, mais entendemos que nossa capacidade de realização é infinita. Temos mais recursos e opções para melhorarmos tanto nossa vida quanto a vida de quem nos cerca — no caso de nossa protagonista, o povo de um reino.

>> Leia um trecho de As mil noites

 

Fabiane Pereira é jornalista, pós-graduada em Jornalismo Cultural pela ESPM e em Formação do Escritor pela PUC-Rio. É mestranda em Comunicação, Cultura e Tecnologia da Informação no Instituto Universitário de Lisboa. É curadora do projeto literário Som & Pausa e toca vários outros projetos pela sua empresa, a Valentina Comunicação. Foi apresentadora do programa Faro MPB, na MPB FM, e atualmente comanda o boletim Faro Pelo Mundo, na mesma emissora.

testeZózimo e a história do Rio

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A Intrínseca acaba de lançar a biografia do jornalista Zózimo Barrozo do Amaral. Para quem não sabe, Zózimo foi um dos maiores colunistas do jornalismo brasileiro. Atuou entre 1969 e 1997 nos dois principais jornais cariocas da época, Jornal do Brasil e O Globo, e mudou a forma de fazer colunismo social, usando notas curtas e incluindo a política, entre outros temas, no conteúdo.

O livro Enquanto houver champanhe, há esperança, maravilhosamente bem escrito pelo jornalista Joaquim Ferreira dos Santos, recupera, além da vida do colunista, um longo período da história do Rio de Janeiro. Não se trata de um relato formal e cronológico dos fatos, mas de um sensível olhar sobre as mudanças de comportamento dos cariocas e, de certa forma, dos próprios brasileiros ao longo das últimas décadas.

Mesmo tendo como foco o cotidiano nas redações da grande imprensa nacional, a biografia de Zózimo consegue captar como a vida na cidade foi se transformando, desde o reinado inquestionável do café-society e das famílias ricas e tradicionais (Guinle, Monteiro Aranha, Marinho etc.) até os dias de hoje, com o domínio das celebridades de prestígio muito questionável, como jogadores de futebol, estrelas de reality show e todo tipo de arrivista.

Imagino que a Intrínseca, isto é, o publisher Jorge Oakim, tenha consciência da relevância editorial da história do Rio de Janeiro. Pois nos últimos meses foram lançados pelos menos dois livros, Os Guinle e essa biografia de Zózimo, que resgatam as mudanças no estilo de vida e na cultura dos cariocas ao longo do século XX. A curiosidade sobre a vida no Rio de Janeiro não se restringe aos estudiosos e ao público local. Em todo o país, e mesmo no exterior, há um enorme interesse sobre o passado recente da capital cultural do Brasil.

testeAssista ao trailer de Antes que eu vá, filme que estreia em 2017

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Sexta-feira, 12 de fevereiro, é o último dia de vida de Samantha Kingston, uma garota que até então tinha tudo: o namorado mais cobiçado do colégio, três amigas fantásticas e uma vida privilegiada. Mas ela recebe uma segunda chance. Sete “segundas chances”, na verdade. E, ao reviver o mesmo dia vezes seguidas, Samantha descobre, enfim, o verdadeiro valor de tudo o que está prestes a perder. 

Este é o mote de Antes que eu vá, romance de Lauren Oliver (autora também da série Delírio) que está sendo adaptado para os cinemas. Dirigido por Ry Russo-Young, o filme tem estreia prevista para 3 de março de 2017 nos Estados Unidos e é estrelado por Zoey Deutch (Samantha Kingston), Halston Sage (Lindsay), Kian Lawley (Rob), Logan Miller (Kent), Cynthy Wu (Ally Harris), Elena Kampouris (Juliet Sykes) e Medalion Rahimi (Elody).

No romance publicado em 2011 pela Intrínseca, Lauren expõe as complexas relações que se formam dentro de uma escola, fugindo dos estereótipos habituais. Suas personagens, que inicialmente transparecem simplesmente egoísmo e superficialidade, são densas, guardam segredos e mágoas. Ao tentar mudar os acontecimentos do dia ao qual está presa, sua heroína se humaniza e, pela primeira vez, reflete sobre sua relação com as amigas, com a família, e sobre como seria o “último dia” que gostaria de viver.

Confira as fotos das filmagens:

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>> Leia um trecho de Antes que eu vá

testeGanância em família

Por João Lourenço*

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“Todas as famílias felizes se parecem; cada família infeliz é infeliz à sua maneira.” Você não precisa ter lido Anna Karenina para saber disso. Antes mesmo de aprender a ler, eu ouvia minha avó dizer algo semelhante ao que escreveu Tolstói no século XIX. Com um sotaque italiano carregado, ela repetia que família só muda de sobrenome e endereço. A grana, livro de estreia de Cynthia D’Aprix Sweeney, confirma essa máxima: família é tudo igual — principalmente quando há dinheiro envolvido.

Em A grana, acompanhamos a saga dos Plumb, uma típica família de classe alta de Nova York. São quatro irmãos de meia-idade, que não convivem bem entre si, e uma mãe distante e excêntrica. A história tem início quando o primogênito, Leo, escapa embriagado de uma festa de casamento com uma jovem garçonete e acaba provocando um constrangedor acidente de carro — eventualidade que transformará drasticamente o destino de toda a família.

A única coisa que une os Plumb é a ânsia pela distribuição do “pé-de-meia”. Trata-se de um fundo de investimento criado pelo patriarca, Leonard, que só poderia ser entregue aos filhos quando Melody, a caçula, completasse 40 anos. O dinheiro, depois de ter rendido muito bem em um fundo de investimento, serviria para assegurar um futuro mais confortável para eles, no entanto, grande parte do montante acaba sendo gasto para remediar os problemas causados pelo acidente de Leo. E é claro que seus irmãos tinham outros planos.

Ignorando o conselho do pai (“nunca conte com o ovo no fiofó da galinha”), os filhos passaram anos acumulando dívidas e listando projetos para o dia em que recebessem sua fatia do “pé-de-meia”. Melody, esposa e mãe de gêmeas adolescentes, tem uma hipoteca cara e duas mensalidades universitárias se aproximando; Jack, dono de uma loja de antiguidades, escondeu do marido que a casa de verão foi usada como garantia de empréstimo para pagar dívidas; Beatrice é uma escritora em decadência que teve que devolver o adiantamento do seu livro após não cumprir os prazos da editora.

Depois do acidente, a trama acompanha Leo por uma Nova York fria e chuvosa em uma peculiar tentativa de acalmar o ânimo de seus irmãos. Há anos os quatro não passavam nem os feriados juntos e a questão da grana acaba os obrigando a se reencontrar.

A grana é recheado de cinismo, com personagens afiados em suas narrativas autodepreciativas, e atraiu a atenção de nomes como a comediante Amy Poller, da série de TV Parks and Recreations. Poller descreveu o livro como intoxicante: “Não consegui parar de ler e de me preocupar com essa família disfuncional.” O destaque cômico fica para a personagem Francie, a mãe dos Plumb, que parece ter saído de um reality show como The Real Housewives of New York. Francie é daquelas socialites de língua afiada, que fazem comentários nada corretos e passam o dia de quimono de seda, afogando as mágoas em taças de martíni.

A grana é dividido em capítulos curtos e Sweeney intercala a trama principal com pequenas histórias de personagens secundários. Entre as desventuras da família Plumb, a autora encaixa capítulos que funcionam como contos que poderiam ser lidos isoladamente. É como se ela convidasse o leitor a fazer pausas para respirar. O capítulo 11, por exemplo, é uma das histórias mais honestas e comoventes sobre as consequências dos atentados de 11 de Setembro que já li.

De modo geral, o livro é uma carta de amor a Nova York, onde a autora morou por mais de 20 anos. A experiência de Sweeney pode ser percebida em uma escrita que descreve fielmente o mood da cidade. Com uma gama impressionante de detalhes, ela nos transporta para parques, restaurantes, hotéis e bares conhecidos de Nova York. O livro é um prato cheio para quem já está habituado com as ruas e segredos da Big Apple e também para quem pretende um dia visitar a cidade. A autora vai além dos cartões-postais e aborda temas como fama, poder, gentrificação, segurança pública, rede de ensino, cultura de mídia e, claro, ganância.

Mãe de dois filhos e casada com o braço direito do apresentador de TV Conan O’Brien, Cynthia D’Aprix Sweeney, depois de mais de duas décadas em Nova York, foi para Los Angeles com a família e abandonou uma carreira sólida no mundo da publicidade para estudar escrita criativa. Na etapa final do curso, incentivada por um professor, ela transformou o conto que já vinha trabalhando havia meses em romance. Assim nasceu A grana.

O título foi adquirido por uma quantia milionária, fato cada vez mais raro entre romances de estreia. Vai virar filme e, de acordo com a Amazon e o The New York Times, foi um dos livros mais vendidos em 2016. Agora, Sweeney prepara o roteiro para a adaptação cinematográfica do livro, que já conta com Jill Solloway, da série de TV Transparent, como diretora e produtora do projeto.

 

João Lourenço é jornalista. Passou pela redação da FFWMAG, colaborou com a Harper’s Bazaar e com a ABD Conceitual, entre outras publicações estrangeiras de moda e design. Atualmente está em Nova York tentando escrever seu primeiro romance.