Cristina Tardáguila

O detetive que recuperou “O grito”

16 / fevereiro / 2016

Grito 1

O grito, de Edvard Munch (fonte)

Charles Hill, o homem que recuperou “O grito”, de Edvard Munch, é um inglês corpulento, de rosto quadrado e franja ondulada. Em 2013, tomamos um café no sofisticado restaurante do The Wallace Collection, um museu de arte britânica que guarda, em suas 25 galerias, pinturas, mobílias e porcelanas do século XVIII. Hill relembrou sua carreira, esmiuçou o dia a dia do trabalho de detetive de arte e falou sobre suas maiores conquistas.

Em fevereiro de 1994, dois criminosos quebraram a janela do primeiro andar da National Gallery de Oslo, na Noruega, e, numa ação que durou apenas cinquenta segundos, entraram, arrancaram “O grito” da parede e deixaram no local um bilhete sarcástico em que se lia “Thanks for the poor security” (Obrigado pela segurança precária). Avaliada em US$ 72 milhões, a pintura que mostra um homem com as duas mãos ao redor do rosto, gritando de pavor, estava pendurada por um único fio, bem ao lado da janela, e não dispunha de nenhuma conexão com o sistema de alarme do museu. Desesperada com o ataque, a polícia norueguesa pediu ajuda à Scotland Yard, onde Hill trabalhava, e ele foi convidado a entrar em ação.

O primeiro passo de Hill foi elaborar um disfarce. O inglês encarnou Christopher Charles Roberts, um americano que dizia ser funcionário de alto escalão do J. Paul Getty Museum, uma das mais importantes instituições culturais da Califórnia. Na história fictícia armada por Hill, Roberts estaria disposto a pagar um pomposo resgate para que a obra-prima de Munch fosse devolvida a Oslo e, em seguida, exposta nos Estados Unidos. Hill fez com que a informação circulasse nos becos escuros da criminalidade europeia e esperou.

Enquanto isso, caprichou nos detalhes para dar vida a Roberts. Passou até a usar pasta de dentes e creme de barbear americanos. Quando me contou isso, eu ri, mas ele se defendeu:

— Um marchand californiano não pode marcar um encontro com um criminoso em seu quarto de hotel e ter no banheiro uma pasta de dentes e um creme de barbear tipicamente ingleses. O personagem tem que ser americano do início ao fim, e isso não é uma bobagem. É uma questão de segurança.

Três meses depois, Hill já havia se aproximado do grupo de ladrões e chegou à casa de Oslo onde os criminosos guardavam a obra roubada. Teve poucos segundo para ter certeza de que aquele “O grito” não era falso. Só conseguiu isso porque havia estudado absolutamente tudo sobre a obra e sabia, por exemplo, que ela fora pichada anos antes e levava consigo uma frase quase invisível: “Can only have been painted by a madman” (Isso só pode ter sido pintado por um louco). Horas mais tarde, seguindo instruções do detetive, a polícia norueguesa cercou os criminosos e prendeu a quadrilha em flagrante.

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