Por Ana Soares*
Imagine-se em dois cenários. No primeiro, você recebeu um convite para um evento que terá a presença de famosos e da imprensa. Há um dresscode a ser seguido, mas você não tem nada no seu armário que esteja de acordo com a ocasião. No segundo, recebeu uma proposta de emprego ou uma promoção. Serão muitas reuniões pela frente, mas suas roupas atuais não são compatíveis com o novo cargo e você não faz a menor ideia de por onde deve começar.
Nos dois casos, existe uma solução: agendar uma ida ao shopping com uma especialista em compras, ou seja, contratar o serviço de um personal shopper. Trata-se de um profissional que, basicamente, vai conversar com você para compreender melhor suas necessidades e seus desejos de acordo com seu estilo de vida a fim de identificar que tipo de roupas combinam melhor com sua personalidade. É um serviço exclusivo no qual, após passar algumas horas em sua companhia, o personal shopper seleciona peças que tenham a sua cara ou que transmitam a imagem que você deseja passar para o resto do mundo.
O trabalho como consultora de estilo é o de utilizar as ferramentas oferecidas pela moda como meios de empoderar — e não aprisionar — quem as veste. É um processo que passa, muitas vezes, pela redescoberta do corpo. Ao se despir em um provador, a pessoa expõe questões profundas e a escolha do que vestir pode revelar muito sobre sua autoestima, suas inseguranças ou carências.
Ícone de moda e precursora do serviço de personal shopper, Betty Halbreich — hoje uma garota de 86 anos — tem, desde a infância, o talento de escolher as melhores roupas e acessórios. Ela divide conosco sua trajetória, entre lembranças e referências, em seu livro de memórias Um brinde a isso.
Em plena atividade, o eterno símbolo de elegância passeia pelos sete andares da luxuosa e histórica loja de departamentos novaiorquina Bergdorf Goodman, que abriga marcas como Givenchy, Lanvin e Prada, convicta de que seu trabalho envolve muitas possibilidades além das etiquetas grifadas. É capaz de melhorar e dar sentido à vida de muitas pessoas — incluindo a sua.
Leia um trecho de Um brinde a isso
Seu talento conquistou uma legião de clientes fiéis que se tornaram grandes amigas, entre elas famosas como a saudosa Joan Rivers, do programa de TV Fashion Police, a atriz Lauren Bacall e Lena Dunham, roteirista e protagonista da série Girls. O reconhecimento também vem com convites para projetos no cinema, no teatro e na TV. Betty já foi responsável pelos figurinos de dezenas de filmes e de peças da Broadway, além da parceria bem-sucedida com a stylist Patricia Field para a icônica série Sex and the City.
Quem procura os serviços nem sempre precisa de mais uma roupa, e Betty sabe que vestir os outros pode ser uma forma de ajudá-los a encarar o mundo de uma forma mais positiva, a se sentirem mais confiantes e seguros. Ela mesma se reinventou ao começar a trabalhar aos quarenta anos, após ficar internada em um hospital psiquiátrico por não conseguir lidar com a solidão após o fim de seu casamento e a indiferença dos filhos.
Além de não acreditar na efemeridade das tendências, a low profile Betty tem fortes convicções: roupas não devem ser descartáveis e compras não preenchem vazios existenciais. Sincera, ela não hesita quando a peça não cai bem ou não tem a ver com o estilo de quem a veste — é perfeitamente capaz de deixar clientes irem embora de mãos vazias.
Sem pretensão alguma, Betty foi visionária ao propagar a ideia de que moda não precisa necessariamente ser cara e inacessível. E seu discurso reforça uma atual e necessária ordem do consumo mundial, voltada para compras conscientes e o slow fashion. “Meu trabalho não é entulhar closets com itens inúteis. Na verdade, meu lema é: não visto closets. Minha função também não é ditar moda. É possibilitar que as pessoas se deem ao prazer de comprar coisas bonitas, se sintam importantes e se sintam melhor.”
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*Ana Soares é consultora de estilo com foco em moda acessível. No blog Hoje Vou Assim OFF publica seus pensamentos sobre consumo consciente e autoestima e mostra como ser feliz com o que se tem no guarda-roupa.
Legal que depois desse boom de tendências e blogs te ditando moda, há uma onda que me parece muito válida, o consumo consciente e o amor a si próprio. Ela não é de agora, como vovó já me dizia e trás algo além de marcas e peças, traz pessoas e isso é o mais interessante. Adorei a resenha e vou sair atrás do livro.