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A última dança de Chaplin

19 / março / 2015

*Por Fabio Stassi

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Charles Chaplin em cena de “O garoto”

Há histórias que são como a patente de uma invenção pela qual não se teve dinheiro para pagar o depósito. Para capturá-las, é necessário subtrair à vida e aos livros tudo o que é possível — nomes, cenas, cenários — e depois misturar tempos e lugares. Li a autobiografia de Chaplin pela primeira vez quando garoto e sempre voltei a ela ao longo dos anos. Mas, como dizia Jean-Claude Izzo, a fórmula é conhecida e nunca é inútil repeti-la: a aventura que vocês leram é totalmente imaginária, embora contenha muitas situações verdadeiras.

Capa_AUltimaDancaDeChaplin_300dpiMinha intenção era imprimir à história um andamento musical, orquestrado em quatro movimentos: allegretto, adagio, andante con variazione e finale. Mas não consegui muito mais do que uma pequena balada das coisas de cabeça para baixo, embora ela tenha me reservado companhia assim mesmo, ao raiar do dia, na minha Last Continental Railroad, entre Viterbo e Roma. Naturalmente, a vida com os seus eventos tristes ou alegres interveio várias vezes, modificando a direção da trama e mudando o seu tom. Para mim, esta é a última história que contei a uma pessoa querida, e um dos seus últimos sorrisos.

Mas devo confessar que tomei emprestado de outras narrativas alguns nomes. O boxeador Gago Groogan, por exemplo, vocês podem encontrar, mais velho e em outro momento da carreira, em Mr. Vertigo, de Paul Auster. Avistei a abóbada fosforescente e cravejada de estrelas do circo ambulante Bastiani no final de Austerlitz de W.G. Sebald. E Coluccini, o velho palhaço de origem italiana, vocês podem encontrar circulando pela Argentina, nas páginas de Una sombra ya pronto serás, de Osvaldo Soriano, embora ele diga que é um acrobata aposentado. Admito que devo muito às várias entrevistas dadas por Chaplin e a David Robinson, o seu principal biógrafo. E também tenho uma dívida de pelo menos duas metáforas com Gianni Mura e de várias ideias com Massimo Paradiso (tenho certeza de que Mister Fritz o contrataria como roteirista). Quanto à montagem e à fotografia, mandei revelar os rolos na Sicília e sob a luz do Equador, em Quito. O jogo das outras contaminações, deixo para quem tiver vontade de descobri-las.

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Fabio Stassi é considerado um dos escritores mais talentosos da Itália.

De minha parte, sou grato por toda a ajuda que recebi, direta ou indireta, e continuo a pensar, como o velho Charlie, que, na desordem do amor, toda acrobacia é possível. Por isso, pela sua funambulesca paciência, agradeço, também no final, a todos aqueles que por vários motivos me têm à sua volta.

*Nota do autor em A última dança de Chaplin. Leia um trecho da obra que acaba de ser publicada no Brasil.

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