Tem gente que lê aquelas “gotas de sabedoria”. Tem gente que lê horóscopo. Tem gente que tira tarô, que joga búzios, que lê versículos da Bíblia em busca de conselhos. Não desdenho do poder da oração (muito eu rezo no silêncio das horas noturnas), não desdenho do alcance da fé e das misteriosas energias impalpáveis que perpassam este mundo de descrença — acredito em boas vibrações, no poder do pensamento positivo e do amor autêntico. Mas quando estou perdida ou triste ou desconsolada, o que eu procuro mesmo é meu pesado volume de capa branca e creme, com seu perfil feminino feito a bico de pena: a Obra Poética de Sophia de Mello Breyner Andresen.
Sophia é o meu orixá, meu gênio, meu travesseiro. Já borrei algumas páginas do volume tão adorado, já beijei a sua capa consoladora em um ou outro momento de alegria — ainda me lembro da tarde invernal, da caminhada pelas livrarias do Chiado, em Lisboa, atrás do livro que eu queria tanto e que só podia encontrar em terras lusitanas. Custou-me uns bons euros — mas era uma pechincha para a minha alma — e depois atravessei a praça, subi as ladeiras estreitas em direção ao Bairro Alto, carregando o volume enorme na bolsa, protegendo-o da fria chuva invernal enquanto um sol brilhava em mim, tamanha a satisfação de ter a obra de Sophia de Mello Breyner Andresen reunida para sempre sobre a minha mesa de trabalho.
Quando estou buscando uma palavra, um conforto, um estímulo; quando a energia me falta, ou me falta a criatividade, um passeio pela poesia de Sophia sempre me reanima, me incita, me guia. Sophia diz de mim sempre. E é usando do poema que me explico: “Aqui, deposta enfim a minha imagem, tudo o que é jogo e tudo o que é passagem, no interior das coisas canto nua. Aqui livre sou eu — eco da lua, e dos jardins, os gestos recebidos. E o tumulto dos gestos pressentidos, aqui sou eu em tudo quanto amei. Não por aquilo que só atravessei, não pelo meu rumor que só perdi, não pelos incertos atos que vivi. Mas por tudo de quanto ressoei, e em cujo amor de amor me eternizei.”
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