Um escritor que é lido nunca morre

Por Leticia Wierzchowski

25 / julho / 2014

coluna 19_Estou aqui escrevinhando

Estou aqui escrevinhando, e acabo de receber a tristíssima notícia de que o grande Ariano Suassuna faleceu no Recife.

Na última sexta-feira, acordei com a notícia da morte de João Ubaldo Ribeiro. Ele foi um dos autores que me ensinou a sonhar, e o tanto que ri e me emocionei nos seus livros… Bem, fica difícil descrever. Aquele tijolo amarelo, Viva o povo brasileiro, me acompanha para onde vou, caso eu tenha de ficar mais do que uns meses num lugar. E, quando uma das minhas grandes amigas foi viver nos EUA, o que eu dei pra ela levar, como amuleto e lembrança, foi esse romance do Ubaldo. Gosto de folheá-lo a esmo, e sempre saio desses passeios com uma alegria na alma…. Ainda lembro de ver o Ubaldo, certa manhã, no seu boteco preferido, jogando conversa fora, de bermuda e chinelos, e que vontade tive eu de ir lá e dar-lhe um abraço ─ mas a timidez me fez atravessar a rua ─ e me mandar logo dali, afastando a mundana tentação de ficar mirando de longe um dos meus escritores preferidos tomar uma cerveja com seus amigos.

No sábado, foi a vez de Rubem Alves. Que delicadeza tão azul eu levava de cada um dos seus poemas e textos ─ Rubem Alves fará muita falta neste mundo de agudezas e virulências. Foi duro de aguentar aquela notícia, ainda mais uma em cima da outra. Então eis que Ariano Suassuna não deixou por menos e teve um AVC.  Assim não vale, Ariano! Ainda me lembro de antigas tardes sob o sol invernal, lendo as fabulosas histórias do Suassuna, sentada no terraço da velha casa dos meus pais, e pensando na magia que ele tinha no dom de criar ─ era um lorde, um gênio das palavras, o grande contador do Brasil.

E tudo isso ─ todas essas tristezas em série ─ me lembram uma história: muito anos atrás, comprei numa lojinha no Rio três miniaturas de escritores que eu admirava: Vinicius de Moraes, Jorge Amado e João Ubaldo. A miniatura do Vinicius foi a primeira a sumir, inexplicavelmente. A do Jorge Amado, numa tarde, anos depois, espatifou-se em mil pedaços no chão por causa de um vento encanado. No dia seguinte a esse acidente veio a notícia de que Amado tinha morrido. Nunca me esqueci da estranha coincidência e guardei o boneco do João Ubaldo com redobrado zelo, bem longe dos meus meninos sapecas e dos ventos inesperados que costumam varrer este meu apartamento ─ e o boneco ainda está ali no seu honroso lugar. Mas João Ubaldo já se foi (e muito bem acompanhado). Ficarão todos para sempre, eternizados naquilo que tinham de mais grandioso ─ a palavra.

LETICIA WIERZCHOWSKI é autora de Sal, primeiro romance nacional publicado pela Intrínseca, e assina uma coluna aqui no Blog.

Nascida em Porto Alegre, Leticia estreou na literatura aos 26 anos e publicou 11 romances e novelas e uma antologia de crônicas, além de cinco livros infantis e infantojuvenis. Um de seus romances mais conhecidos é A casa das sete mulheres, história que inspirou a série homônima produzida pela Rede Globo e exibida em 30 países.

 

 

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Leticia Wierzchowski nasceu em Porto Alegre e estreou na literatura aos 26 anos. Já publicou 11 romances e novelas e uma antologia de crônicas, além de cinco livros infantis e infantojuvenis. É autora de SalNavegue a lágrima e de A casa das sete mulheres, história que inspirou a série homônima produzida pela Rede Globo e exibida em 30 países.
Leticia escreve às sextas.

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Comentários

Uma resposta para “Um escritor que é lido nunca morre

  1. Por gentileza, alguém sabe onde posso encontrar uma miniatura dessas do João Ubaldo?

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